terça-feira, 6 de setembro de 2016

“O jornalismo não muda o mundo, mas pode mudar o mundo de alguém”

A jornalista Sílvia Caneco voltou à Escola Superior de Comunicação Social, sítio onde se licenciou, para falar de todo o seu percurso desde que acabou a licenciatura até à sua entrada no mercado de trabalho. Os sítios onde trabalhou, os trabalhos que fez, com quem fez e os livros que lançou foram alguns dos temas abordados pela jornalista.

Sílvia Caneco nasceu em 1984, na Nazaré. Licenciada em Jornalismo pela Escola Superior de Comunicação Social, em Lisboa, começou a trabalhar como jornalista na Região da Nazaré. Depois, estagiou no Público e colaborou com o jornal Público e as revistas Pública e Grande Reportagem. É atualmente jornalista do i, onde trabalha desde 2009, o ano da sua fundação. Recebeu já vários prémios, entre eles o Prémio Literário Orlando Gonçalves e uma menção honrosa no Prémio de Jornalismo Direitos Humanos e Integração. É co-autora do livro Sacanas com Lei, e mais recentemente publicou também As Conversas Secretas do Clã Espírito Santo.

Começando por falar de como tudo começou, Sílvia contou que “estava em Junho e tinha que entregar a minha tese até final de Dezembro. Inscrevi-me num curso de novas tecnologias de informação, no Observatório de Imprensa, em Santarém, e conciliei as duas coisas. No final do ano, terminei o curso e consegui, através desse mesmo curso, um estágio no Público. Estagiei no Ípsilon, durante três meses”. Depois desses três meses de estágio, Silvia recorda que lhe disseram que tinham gostado muito do seu trabalho mas não podiam contratá-la, embora tivesse ficado, mesmo depois de sair do Público, como freelancer a escrever para a Pública.

Depois de ter terminado o estágio, Silvia começou a sentir receio e preocupação, pois não conseguiria trabalhar só como freelancer. E foi então que surgiu uma vaga para o Gabinete de Estágios da Escola Superior de Comunicação Social e acabou por se candidatar e conseguir o lugar. “Fiquei aqui cerca de um ano e conciliava isso com o meu trabalho como freelancer. Depois de um ano de estar aqui, estava com saudades de voltar a uma redacção. E foi então que me disseram que estava para nascer um projecto novo”.
Nessa altura, ia nascer o i. Sílvia candidatou-se. Eram cerca de 1200 candidatos, e não estavam só à procura de pessoas licenciadas em Jornalismo. Foram passando por várias fases até ao final. “A última fase foi uma semana inteira cheia de trabalho, com aqueles que seriam os futuros directores do jornal. Puseram-nos a discutir economia, e deram-nos três horas para ir a Cascais e voltar e trazer uma reportagem, com 5 fotos e ainda editar um vídeo”, recorda. Mas Sílvia ficou. O jornal começou em Maio de 2009 e é lá que Sílvia está até hoje. “Há dois anos, comecei a fazer a área de Justiça. Se quando entrei em Jornalismo só gostava de reportagem, hoje em dia sou uma pessoa dividida. Tanto gosto de fazer reportagem como gosto de fazer investigação”, diz Sílvia.

Em relação ao seu primeiro livro, Sacanas com Lei, escrito em conjunto com Rosa Ramos, Sílvia conta que nasceu de crónicas publicadas no jornal, também elas resultantes dos testemunhos das duas jornalistas que, ao longo de vários meses, presenciaram dezenas de histórias do pequeno crime à portuguesa.

Mais recentemente, foi então publicado o livro “As Conversas Secretas do Clã Espírito- Santo”, desta vez, só escrito por Sílvia. “Tentei ao máximo que as pessoas sentissem que estavam naquelas reuniões. As únicas coisas que ficaram de fora foram coisas que eu achei que podiam ofender alguém, coisas que, se não vinham acrescentar nada à história, mais valia ficarem de fora. Declarações ofensivas sobre um colega jornalista, por exemplo”.

Sílvia Caneco conta que, no i, já fez um pouco de tudo. “Não tinha formação em economia, tive de ir estudar. Tinha medo de escrever certas coisas mal porque esta não era a minha área. Mas se não tentarmos, nunca sabemos como é”.

No que diz respeito a reportagens, Sílvia Caneco diz que tinha uma ideia muito mais romântica do jornalismo. “Uma pessoa gosta de fazer reportagem mas muitas vezes também gostava que nos dessem tempo para isso e, muitas vezes, esse tempo não existe. Nós chegamos ao jornais e já são poucos aqueles que pagam a alguém para ir fazer reportagens para fora. Eu saí uma vez do país. Saí daqui pra ir a Dili e cheguei lá, dei uma voltinha, e voltei pra trás”.

Sílvia falou ainda da sua reportagem “Carolina, 15 anos, voltou a ser vítima de abusos. Os alarmes soaram, mas ninguém fez nada”, uma reportagem sobre uma menina de 15 anos que foi violada mais do que uma vez e que, para Sílvia, foi uma reportagem que lhe deu “um especial gozo porque, pela primeira vez, senti que de facto o jornalismo não muda o mundo mas pode mudar o mundo de alguém”. Para terminar, Sílvia Caneco deixou um conselho para todos os futuros jornalistas: “Se quiserem muito muito muito jornalismo, insistam. Têm que tentar, e é importante que tenham um assunto que chame à atenção”.

Inês Antunes Malta

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