terça-feira, 6 de setembro de 2016

Isaura Santos - Estou humildemente à procura da minha oportunidade para poder fazer música e criar qualquer coisa que ainda não exista”


Uma jornalista de ciência que compõe, canta e fotografa, com base em tudo o que os dias lhe vão oferecendo. Áreas que, à primeira vista, não têm relação entre si, mas afinal essa relação existe. Em Isaura. Um desejo. Uma surpresa. Uma promessa. Dois singles conhecidos. Um EP por conhecer.


Isaura Santos, 25 anos, é natural de São Paio, Gouveia, e estudou Biologia Celular e Molecular na Universidade Nova de Lisboa (UNL). Para além desta licenciatura, tem ainda um mestrado no curso Comunicação, Cultura e Tecnologias da Informação, do Instituto Universitário de Lisboa (ISCTE-IUL). Hoje, é jornalista de ciência, trabalha para a BioNews Service, uma empresa localizada nos Estados Unidos da América, e na qual escreve artigos sobre doenças e sobre os avanços que vão surgindo no seu respectivo tratamento. No entanto, é na música que vê a sua oportunidade para conseguir fazer algo novo, algo diferente do que já existe. Em 2010, participou na Operação Triunfo, da RTP, mas tudo o que está a acontecer agora é um recomeço, um começar do zero. Depois do sucesso do seu primeiro single “Useless”, Isaura é considerada por muitos uma promessa no que diz respeito ao futuro da música pop nacional, e prepara-se agora para dar o  próximo passo: o lançamento, a 7 de Maio, da sua nova música - “Change It” -, também esta pertencente ao seu EP - “Serendipity”.


Inês Malta - Participou na 4ª edição da Operação Triunfo, em 2010, onde cantou vários temas como You Got The Love, dos Florence and the Machine, The Story da Brandi Carlile e Ironic da Alanis Morissette. Como foi toda essa experiência na Operação Triunfo?
Isaura Santos - A Operação Triunfo serviu para ter palco e experiência. Foi uma prova de esforço entre estar à frente de tanta gente, ter de passar por tantos castings e cantar, mas também vestir, representar e dançar num registo que não era, genuinamente, o meu.  
IM - Pode dizer-se que foi aqui que começou todo o seu percurso a nível musical ou começou muito antes disso?
IS - Eu gosto de música desde que me lembro de existir, e desde os 16 ou 17 anos que canto em bares. Aliás, fi-lo até há bem pouco tempo. Mais do que gostar de cantar, sempre me soube inventiva e desde cedo que tentava compor. Aos 11 anos, quando comecei a aprender guitarra, o que mais gostava de fazer era precisamente compor. E compunha, ainda que coisas pavorosas.


IM - Sente que foi isso que lhe deu mais visibilidade e, de certa forma, também mais força para continuar e para ter chegado onde está hoje?
IS - A operação triunfo foi uma prova desse meu amor pela música, que me fez querer enfrentar esse desafio com toda a garra que tivesse. Nunca fui à procura de coisas complicadas, no fundo queria conhecer alguém pelo caminho que quisesse ouvir as minhas próprias canções; e, ainda que indiretamente, foi exatamente o que aconteceu. O que está a acontecer não é de todo uma continuidade da Operação Triunfo, é como se tivesse começado do zero.


IM - O seu primeiro single - “Useless” - foi lançado em 2014. Como é que nasceu este single? Foi escrito por si?
IS - “Useless” foi escrito e composto por mim pouco depois de ter deixado a Operação Triunfo.


IM - Em que é que se inspirou para o escrever, para o criar? O que é que queria que este tema fosse, o que é que deseja que ele provocasse nas pessoas?
IS - O tema fala de quando partimos para uma história, seja uma amizade ou um amor, que sabemos à partida que está condenado. Ainda assim, precisamos de a viver e de ir até ao fim com ela; acho que toda a gente tem uma história assim.


IM - A produção deste primeiro single esteve também a cargo de Raez e de Cut Slack. Como é que se estabeleceu esta “parceria”, por assim dizer, na produção da música?
IS - Eventualmente, acabei por conhecer o Miguel, que é o meu manager. Aliás, graças à Operação Triunfo, conheci pessoas muito importantes e que agora guardo com muito carinho na minha vida. Acho que isso é o que de mais importante a OT me deu. Essas pessoas levaram-me ao Miguel, que trabalha comigo com o mesmo afinco e empenho que eu mesma, e o Raez era um amigo dele que também acreditou no potencial da minha canção. Por fim, o Cut Slack, também por acreditar na canção, juntou-se para dar uns pózinhos finais. Acho que isto é o que o single tem de especial: foi feito com pessoas que, de coração, acreditaram que eu merecia essa oportunidade. E eu sou muito grata por isso.


IM - Teve o sucesso que esperava? Como é que foi a reacção das pessoas ao seu primeiro single?
IS - As pessoas gostaram e acarinham a “Useless” como eu nunca teria ousado imaginar. Sou da opinião de que o público quando gosta genuinamente de alguma coisa é gentil e bondoso e entusiasmam-se se entenderem que um trabalho é honesto e bem feito. Eu tive muita sorte e acho que as pessoas se entusiasmaram comigo e por mim.


IM - A “Useless”, tal como o seu segundo single - “Change It” - que vai sair dia 7 Maio, fazem parte do seu primeiro EP. O que é que as pessoas podem esperar? Para quem acompanha o seu trabalho, este novo single vai ser uma surpresa?
IS - O novo single “Change It”, produzido com Ben Monteiro, dos D’Alva, é uma canção diferente. A maioria das minhas canções contam histórias que vivi ou que vi. A “Change It”, no entanto, é mais do que isso; esta canção é uma escolha. “Change It” é a consciência de que posso usar dos quatros minutos e três segundos que as pessoas me oferecem para lhes recordar algo importante. É parar de falar de mim para falar de coisas maiores e que se escondem no silêncio, na falta de coragem, no preconceito e na opressão. Esta canção fala do amor em qualquer género, sob qualquer orientação sexual, protagonizado em qualquer cor ou cultura; relembra que o amor é amor desde que seja genuíno e inocente. É uma canção que pede às pessoas para mudar o que não está certo, o que quer que seja. Pede para que mudemos um traço de personalidade, um trabalho de que não se gosta ou, quem sabe, mentalidades. É mais um pequeno passo.


IM - Os temas são feitos com base em quê, concretamente? O que é que a inspira?
IS - Acho que são inspirados nas coisas que sinto e que vejo, não sei ao certo. Sento-me à guitarra e faço e ajo sem filtro; como se fosse o meu diário ou a minha forma de desabafar coisas que nem eu própria percebo que estou a sentir. Saem muitos rascunhos que vão para o lixo e outros a que acabo por me dedicar e terminar para que se transformem em canções que contam uma história. Gosto sempre que cada canção leve uma história em vez de frases soltas.


IM - São todos escritos e cantados por si? Ou vai contar também com participações especiais, seja a nível da escrita ou da própria música em si?
IS - Os temas são todos cantados, escritos e compostos por mim, e produzidos pelo Cut Slack, que produziu 3 temas, e pelo Ben Monteiro, que produziu a música “Change It”.


IM - O seu álbum vai chamar-se “Serendipity”, que significa encontrar algo bom sem estarmos à espera que tal aconteça. Porquê a escolha deste nome?
IS - O EP chama-se “Serendipity”, que significa um conceito algo complicado de explicar. Trata-se de encontrar um sentido, conexões, naquilo que à primeira vista possa parecer obra do acaso. Acho que é isso mesmo que o EP representa e não lhe poderia ter dado outro nome. Estas canções podiam existir nos meus cadernos mas nunca teriam saído deles sem encontrar cada uma das pessoas e das situações que me fizeram estar aqui hoje, a responder a estas mesmas perguntas. É uma infinidade de acontecimentos encadeados.


IM - Actuou na Moda Lisboa deste ano e, mais recentemente no Musicbox, com os D’Alva.
IS - Eu, acima de tudo, fico genuinamente contente quando as pessoas gostam das minhas músicas e, portanto, acabo a divertir-me a estar de alma e coração em qualquer concerto. Na ModaLisboa, foi um contexto diferente; nunca pensei que se desfilasse ao som de uma música minha. Tive oportunidade de conhecer melhor o trabalho incrível do Luís Carvalho, e foi uma experiência que hei-de guardar sempre com muito carinho. No Musicbox, foi incrível. Pude tocar pela primeira vez o meu EP, acompanhada pelo Mike Bek, e ter o privilégio de ter os D’alva a puxar por mim. Foi bom para perceber as emoções que as músicas despertam nas pessoas e já estou a pensar em abordagens novas para o próximo concerto.


IM - Que tipo de música é que tem no mp3? Que músicas, que artistas, é que a influenciam na escrita e produção das suas próprias músicas?
IS - Eu oiço uma grande misturada de estilos musicais. Tenho uma preferência pelo pop alternativo mas oiço de tudo um pouco. As várias sonoridades de cada estilo musical acabam por dar sempre uma contribuição relevante. Usando-as como referência ou não, é importante ouvir de tudo e, conscientemente, deixar coisas de fora. Tento ouvir de tudo e reinterpretar naquilo que me saia mais naturalmente, que é o pop urbano.


IM - Segundo o jornalista Pedro Primo Figueiredo, é “no presente, a mais perfeita noção musical do que o futuro pop pode e deve ser em Portugal”. O que é que é, no presente, fazer música em Portugal? E o que é que implica ter sobre si todo este reconhecimento que diz que é uma promessa na música nacional? “Uma nova e gloriosa voz no meio da pop electrónica nacional”, segundo o mesmo.
IS - Eu estou a começar e, na verdade, eu ainda não faço música. Eu fiz um EP com 5 canções e um remix. Eu estou humildemente à procura da minha oportunidade para poder fazer música e para me poder juntar a quem sabe para trabalhar e criar qualquer coisa que ainda não exista. É esse o meu conceito, tentar fazer sempre qualquer coisa diferente. As pessoas terem boas expectativas para mim e terem-me dado esta oportunidade representa o mundo mas eu sinto o dobro em responsabilidade e em vontade de trabalhar. A curto prazo, espero que as pessoas gostem e queiram também ouvir mais.


IM - No seu vídeo de apresentação da Operação Triunfo, assumia como máxima a frase: “Se não venceste pelo talento, vence pelo esforço”. Continua a ser assim?
IS - Esta sempre foi e continua a ser a minha certeza. Acho que alcançamos poucas coisas graças ao talento só. Eu nem sei ao certo como é que se mede o talento, é um conceito abstrato e eu gosto de coisas que possamos medir porque sou de ciência. O esforço e o trabalho medem-se em dedicação e em horas de compromisso. Parece-me mais justo que tenhamos oportunidades consoante aquilo com que nos empenhamos. Vejo muito talento desperdiçado em preguiça e vejo muita falta de jeito superada em dedicação, e é nisto que acredito. Acredito que podemos ser e fazer o que quisermos, só temos de querer e de nos concentrar. E, claro, de esperar um pouco de sorte para nos acompanhar os dias e para nos brindar com a felicidade de estar no sítio certo à hora exacta.


IM - As redes sociais tiveram/têm um papel fundamental nesta divulgação e reconhecimento do seu trabalho?
IS - Hoje em dia, as redes sociais funcionam como uma plataforma de curadoria. As pessoas, quando gostam de alguma coisa, neste caso ao terem gostado da Useless, partilharam-na e fizeram-na chegar a quase 200000 pessoas, que foi o alcance que tive na altura com a publicação do vídeo no facebook. E é por fenómenos como este que tenho esperança em acreditar no trabalho e na força de vontade.

IM - Para além da música, tem a licenciatura em Biologia Celular e Molecular, e o mestrado em Comunicação, Cultura e Tecnologias da Informação.
IS - Eu sou jornalista de ciência. Escrevo artigos sobre doenças e técnicas novas para as tratar para uma empresa localizada nos Estados Unidos. A ciência fascina-me, mas desde cedo percebi que o meu lugar não passaria por estar no laboratório mas talvez por falar de ciência àqueles que não estão formatados para a compreender. Gosto de estudar e de estar constantemente a aprender, é um vicio. Nesta área profissional, gosto particularmente da comunicação de ciência em televisão. É uma área que me fascina e que gosto que faça também parte de mim.


IM - No seguimento desta questão acerca das redes sociais, não podia deixar de falar no instagram. A sua conta no instagram é um sítio onde partilha as suas fotografias, sejam elas mais ou menos pessoais.
IS - Sou uma miúda que se encanta com os aviões no céu, com prédios bonitos e gatos elegantes e gosto de registar tudo, ainda que tenha a certeza que os meus olhos vêem em mais bonito do que a câmara do telemóvel.


IM - O gosto pela fotografia portanto faz também parte da sua vida. Nunca foi uma possibilidade seguir esse caminho e vir talvez a trabalhar nessa área?
IS - Nunca pensei em seguir fotografia mas desde miúda que adoro fotografar. Gosto pouco de ser fotografada, mas gosto de brincar e de ir registando um pouco do meu dia dessa forma. Tenho pouco tempo para escrever e tomar notas, e acho o instagram uma ferramenta incrível para registar o que os dias me vão dando. O Instagram faz-nos viajar sem sair do lugar e quero ir a demasiados sítios no mundo para aquilo que talvez seja possível, portanto, vou tentando viajar por ali.

(Maio de 2015)
Inês Antunes Malta

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